Processo C-328/12
Ralph Schmid
contra
Lilly Hertel
Pedido de decisão prejudicial: Bundesgerichtshof – Alemanha.
Reenvio prejudicial – Cooperação judiciária em matéria civil -Regulamento (CE) n.º 1346/2000- Processos de insolvência – Ação resolutória baseada na insolvência – Domicílio do demandado num Estado terceiro – Competência do órgão jurisdicional do Estado-Membro centro dos interesses principais do devedor.
Sumário do acórdão
O artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1346/2000 do Conselho, de 29 de maio de 2000, relativo aos processos de insolvência, deve ser interpretado no sentido de que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi instaurado o processo de insolvência têm competência para conhecer de uma ação resolutória no âmbito da insolvência contra um demandado cujo domicílio não se situa no território de um Estado‑Membro.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)
«Reenvio prejudicial – Cooperação judiciária em matéria civil – Regulamento (CE) n.° 1346/2000 – Processos de insolvência – Ação resolutória baseada na insolvência – Domicílio do demandado num Estado terceiro – Competência do órgão jurisdicional do Estado‑Membro do centro dos interesses principais do devedor»
No processo C‑328/12,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Bundesgerichtshof (Alemanha), por decisão de 21 de junho de 2012, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de julho de 2012, no processo
Ralph Schmid, que age na qualidade de administrador da insolvência no processo de insolvência relativo ao património de Aletta Zimmermann,
contra
Lilly Hertel,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),
composto por: A. Tizzano, presidente de secção, K. Lenaerts, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Primeira Secção, A. Borg Barthet, E. Levits e M. Berger (relatora), juízes,
advogado‑geral: E. Sharpston,
secretário: K. Malacek, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 10 de abril de 2013,
vistas as observações apresentadas:
– em representação de R. Schmid, que age na qualidade de administrador da insolvência no processo de insolvência relativo ao património de A. Zimmermann, por G. S. Mohnfeld, Rechtsanwalt,
– em representação do Governo alemão, por T. Henze e J. Kemper, na qualidade de agentes,
– em representação da Comissão Europeia, por W. Bogensberger e M. Wilderspin, na qualidade de agentes,
ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 10 de setembro de 2013,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1346/2000 do Conselho, de 29 de maio de 2000, relativo aos processos de insolvência (JO L 160, p. 1, a seguir «regulamento»).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre R. Schmid, que age na qualidade de administrador da insolvência no processo de insolvência relativo ao património de A. Zimmermann (a seguir «devedora»), e L. Hertel, residente na Suíça, relativamente a uma ação resolutória.
Quadro jurídico
3 Os considerandos 2 a 4, 8, 12 e 14 do referido regulamento enunciam:
«(2) O bom funcionamento do mercado interno exige que os processos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços se efetuem de forma eficiente e eficaz […]
(3) Cada vez mais, as atividades das empresas produzem efeitos transfronteiriços e são, por este motivo, regulamentadas por legislação comunitária. Como a insolvência dessas empresas afeta, nomeadamente, o bom funcionamento do mercado interno, faz‑se sentir a necessidade de um ato da Comunidade que exija a coordenação das medidas a tomar relativamente aos bens de um devedor insolvente.
(4) Para assegurar o bom funcionamento do mercado interno, há que evitar quaisquer incentivos que levem as partes a transferir bens ou ações judiciais de um Estado‑Membro para outro, no intuito de obter uma posição legal mais favorável (forum shopping).
[…]
(8) Para alcançar o objetivo de melhorar a eficácia e a eficiência dos processos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços, é necessário e oportuno que as disposições em matéria de competência, reconhecimento e direito aplicável neste domínio constem de um ato normativo da Comunidade, vinculativo e diretamente aplicável nos Estados‑Membros.
[…]
(12) O presente regulamento permite que o processo de insolvência principal seja aberto no Estado‑Membro em que se situa o centro dos interesses principais do devedor. O processo tem alcance universal, visando abarcar todo o património do devedor. […]
[…]
(14) O presente regulamento aplica‑se exclusivamente aos processos em que o centro dos interesses principais do devedor está situado na Comunidade.»
4 Nos termos do artigo 1.°, n.° 1, do regulamento:
«O presente regulamento é aplicável aos processos coletivos em matéria de insolvência do devedor que determinem a inibição parcial ou total desse devedor da administração ou disposição de bens e a designação de um síndico.»
5 O artigo 3.° do regulamento, intitulado «Competência internacional», dispõe no seu n.° 1:
«Os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território está situado o centro dos interesses principais do devedor são competentes para abrir o processo de insolvência. […]»
6 O artigo 5.°, n.° 1, do regulamento prevê:
«A abertura do processo de insolvência não afeta os direitos reais de credores ou de terceiros sobre bens corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis, quer sejam bens específicos, quer sejam conjuntos de bens indeterminados considerados como um todo, cuja composição pode sofrer alterações ao longo do tempo, pertencentes ao devedor e que, no momento da abertura do processo, se encontrem no território de outro Estado‑Membro.»
7 Nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do regulamento:
«A abertura do processo de insolvência não afeta o direito de um credor a invocar a compensação do seu crédito com o crédito do devedor, desde que essa compensação seja permitida pela lei aplicável ao crédito do devedor insolvente.»
8 O artigo 14.° do regulamento tem a seguinte redação:
«A validade de um ato celebrado após a abertura do processo de insolvência e pelo qual o devedor disponha, a título oneroso:
– de um bem imóvel,
– de navio ou de aeronave cuja inscrição num registo público seja obrigatória, ou
– de valores mobiliários cuja existência pressuponha a respetiva inscrição num registo previsto pela lei,
rege‑se pela lei do Estado em cujo território está situado o referido bem imóvel ou sob cuja autoridade é mantido esse registo.»
9 O artigo 25.°, n.° 1, do regulamento dispõe:
«As decisões relativas à tramitação e ao encerramento de um processo de insolvência proferidas por um órgão jurisdicional cuja decisão de abertura do processo seja reconhecida por força do artigo 16.°, bem como qualquer acordo homologado por esse órgão jurisdicional, são igualmente reconhecidos sem mais formalidades. Essas decisões são executadas em conformidade com o disposto nos artigos 31.° a 51.°, com exceção do n.° 2 do artigo 34.°[…] da Convenção de Bruxelas relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, alterada pelas convenções relativas à adesão a essa convenção.
O primeiro parágrafo é igualmente aplicável às decisões diretamente decorrentes do processo de insolvência e que com este se encontrem estreitamente relacionadas, mesmo que proferidas por outro órgão jurisdicional.
[…]»
10 Por força do artigo 44.°, n.° 3, alínea a), do regulamento, este não é aplicável «[e]m nenhum dos Estados‑Membros, quando incompatível com as obrigações em matéria de falência resultantes de uma convenção concluída por esse Estado com um ou mais países terceiros antes da entrada em vigor do presente regulamento».
11 O Anexo A do regulamento contém uma lista dos processos de insolvência previstos no seu artigo 1.°, n.° 1.
Litígio no processo principal e questão prejudicial
12 R. Schmid é o administrador da insolvência designado no processo de insolvência aberto na Alemanha, em 4 de maio de 2007, contra a devedora. A demandada, L. Hertel, reside na Suíça. R. Schmid chamou‑a a juízo nos tribunais alemães, por ação resolutória, requerendo a restituição ao património da devedora de uma quantia de 8 015,08 euros, não incluindo juros. Esta ação foi declarada inadmissível em primeira e segunda instância por falta de competência internacional dos tribunais alemães. R. Schmid interpôs no Bundesgerichtshof recurso de «Revision», prosseguindo o seu pedido resolutório.
13 Este último órgão jurisdicional refere que o litígio no processo principal cai no âmbito de aplicação material do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento. A este propósito, o Bundesgerichtshof remete para o acórdão de 12 de fevereiro de 2009, Seagon (C‑339/07, Colet., p. I‑767), e recorda que, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi dado início ao processo de insolvência têm competência para conhecer de uma ação resolutória baseada na insolvência e proposta contra um demandado cuja sede estatutária se situa noutro Estado‑Membro.
14 Até à data não foi ainda esclarecida a questão de saber se o artigo 3.°, n.° 1, do regulamento também se aplica quando o processo de insolvência tenha sido instaurado num Estado‑Membro, mas o demandado na ação resolutória tenha o seu domicílio ou sede estatutária não num Estado‑Membro, mas num Estado terceiro.
15 O órgão jurisdicional de reenvio entende que, segundo a redação do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento, basta, para efeitos de aplicação desta disposição, que o centro dos interesses principais de devedor se situe num Estado‑Membro. Contudo, a aplicação deste regulamento pressupõe um elemento de estraneidade, não sendo evidente se esse elemento se deve referir a um outro Estado‑Membro ou a um Estado terceiro.
16 Nestas condições, o Bundesgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:
«Os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi instaurado o processo de insolvência relativo ao património do devedor dispõem de competência para conhecer de uma ação [resolutória] no âmbito da insolvência contra um demandado cujo domicílio ou sede estatutária não se situa no território de um Estado‑Membro?»
Quanto à questão prejudicial
17 Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 3.°, n.° 1, do regulamento deve ser interpretado no sentido de que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi instaurado o processo de insolvência dispõem de competência para conhecer de uma ação resolutória no âmbito da insolvência contra um demandado cujo domicílio não se situa no território de um Estado‑Membro.
18 Com o objetivo de responder a esta questão, há desde logo que recordar que o artigo 3.°, n.° 1, do regulamento se limita a prever que são competentes para abrir o processo de insolvência contra um devedor os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território está situado o centro dos interesses principais desse devedor. No caso do processo principal, o centro dos interesses principais do devedor situa‑se na Alemanha.
19 Todavia, a título preliminar, importa determinar se, quando o único elemento de estraneidade da situação em causa é a relação entre um Estado‑Membro e um Estado terceiro, o processo de insolvência é da competência dos tribunais desse Estado‑Membro por força do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento ou se, ao invés, essa questão da competência internacional deve ser resolvida por aplicação do direito nacional desse Estado‑Membro.
20 No caso da questão de saber se a aplicação do regulamento pressupõe, em qualquer caso, a verificação de elementos de estraneidade no sentido de que só são abrangidas por aquele as situações que apresentam elementos de conexão com dois ou mais Estados‑Membros, importa notar que essa condição geral e absoluta não decorre da letra das disposições do regulamento.
21 Com efeito, como recordou a advogada‑geral no n.° 25 das suas conclusões, nem o artigo 1.° do regulamento, que tem por epígrafe «Âmbito de aplicação», nem o seu Anexo A, que inclui uma lista dos processos de insolvência referidos naquela primeira disposição, limitam a aplicação do regulamento aos processos que apresentam um elemento de estraneidade, no sentido evocado no número anterior. O mesmo se diga do considerando 14 do regulamento, segundo o qual a sua aplicação só se exclui no caso de o centro dos interesses principais do devedor se situar fora da União Europeia.
22 Na verdade, a aplicação de várias disposições do regulamento pressupõe a presença de elementos de conexão com o território ou com a ordem jurídica de pelo menos dois Estados‑Membros, como é o caso do artigo 5.°, n.° 1, do regulamento, o qual prevê uma regra relativa a direitos reais de terceiros sobre bens do devedor que, no momento da abertura do processo, se encontrem no território de «outro Estado‑Membro», ou das disposições do capítulo III do regulamento, relativas aos «processos de insolvência secundários», que só visam os processos secundários que forem abertos noutro Estado‑Membro.
23 Todavia, outras disposições do regulamento, como os seus artigos 6.° e 14.°, não contêm tais restrições expressas. Além disso, o artigo 44.°, n.° 3, alínea a), do regulamento dispõe que este não é aplicável em nenhum dos Estados‑Membros, quando incompatível com as obrigações em matéria de insolvência resultantes de uma convenção concluída antes da sua entrada em vigor por esse Estado com um ou mais Estados terceiros. Ora, esta disposição seria, em princípio, supérflua se o regulamento em causa não se aplicasse às relações entre um Estado‑Membro e um Estado terceiro.
24 Neste contexto, no tocante às disposições do regulamento que não preveem expressamente um elemento de estraneidade que implique pelo menos dois Estados‑Membros, cumpre concluir que os objetivos prosseguidos pelo regulamento, como os que são indicados nos seus considerandos, também não militam a favor de uma interpretação restrita do âmbito de aplicação do regulamento, que leve a exigir a existência desse elemento.
25 Com efeito, embora resulte dos considerandos 2 a 4 do regulamento que o seu objetivo é assegurar o «bom funcionamento do mercado interno», decorre todavia do referido considerando 4 que esse objetivo exige, em especial, «evitar quaisquer incentivos que levem as partes a transferir bens ou ações judiciais de um Estado‑Membro para outro, no intuito de obter uma posição legal mais favorável (forum shopping)». O considerando 8 do regulamento refere o objetivo de «melhorar a eficácia e a eficiência dos processos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços», e o considerando 12 do regulamento enuncia que os processos de insolvência que são abrangidos pelo âmbito de aplicação do regulamento «[têm] alcance universal, visando abarcar todo o património do devedor». Estes últimos objetivos podem englobar não só as relações entre os Estados‑Membros mas também, por natureza e de acordo com a sua letra, qualquer situação transfronteiriça.
26 Por último, uma limitação do âmbito de aplicação do regulamento a situações que impliquem necessariamente pelo menos dois Estados‑Membros também não resulta dos objetivos específicos do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento.
27 A este respeito, há que recordar que esta disposição se limita a prever uma regra de competência internacional, segundo a qual «[o]s órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território está situado o centro dos interesses principais do devedor são competentes para abrir o processo de insolvência». Assim, lido à luz do considerando 8 do regulamento, o artigo 3.°, n.° 1, visa incentivar a previsibilidade e, assim, a segurança jurídica no caso das competências jurisdicionais em matéria de insolvência.
28 Ora, o Tribunal de Justiça já decidiu que, para determinar o tribunal competente para abrir um processo de insolvência, o centro dos interesses principais do devedor deve ser determinado no momento da apresentação do requerimento de abertura desse processo (v. acórdão de 17 de janeiro de 2006, Staubitz‑Schreiber, C‑1/04, Colet., p. I‑701, n.° 29). Como salientou a advogada‑geral no n.° 29 das suas conclusões, nessa fase inicial, a existência de qualquer elemento de estraneidade pode ser desconhecida. Contudo, a determinação do órgão jurisdicional competente não pode ser adiada até ao momento em que seja conhecida a localização de diversos aspetos do processo para além do centro dos interesses do devedor, como a residência de potenciais demandados numa ação secundária. Com efeito, aguardar até conhecer esses elementos frustraria os objetivos de eficácia e de eficiência dos processos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços.
29 A aplicação do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento pode, por conseguinte, em termos gerais, depender da existência de uma conexão de estraneidade que implique outro Estado‑Membro.
30 Quanto ao ponto específico de saber se os tribunais dos Estados‑Membros em cujo território foi instaurado o processo de insolvência são competentes para conhecer de uma ação resolutória no âmbito da insolvência contra um demandado que não tem o seu domicílio no território de um Estado‑Membro, importa recordar que o Tribunal de Justiça, no n.° 21 do acórdão Seagon, já referido, decidiu que o artigo 3.°, n.° 1, do regulamento deve ser interpretado no sentido de que atribui aos tribunais do Estado‑Membro competentes para instaurar um processo de insolvência também uma competência internacional para conhecer das ações que decorrem diretamente desse processo e com ele estão estreitamente relacionadas.
31 Na verdade, no n.° 25 do referido acórdão, o Tribunal de Justiça também decidiu que esses órgãos jurisdicionais são, pois, competentes para conhecer de uma ação resolutória no âmbito da insolvência contra um demandado cuja sede estatutária se situa noutro Estado‑Membro.
32 Contudo, o simples facto de o Tribunal de Justiça, nesse mesmo acórdão, se ter limitado a declarar a competência do órgão jurisdicional que deu início ao processo para conhecer de ações contra os demandados estabelecidos noutro Estado‑Membro não permite concluir que tal competência seja a priori excluída no caso desse demandado estar estabelecido num Estado terceiro, dado que o Tribunal de Justiça não se pronunciou sobre essa questão. Com efeito, a demandada no processo que deu origem ao acórdão Seagon, já referido, estava estabelecida num Estado‑Membro.
33 Além disso, importa concluir que os objetivos prosseguidos pelo artigo 3.°, n.° 1, do regulamento, que consistem, como foi recordado no n.° 27 do presente acórdão, em incentivar a previsibilidade da competência jurisdicional em matéria de insolvência e, portanto, a segurança jurídica, militam a favor de uma interpretação no sentido de que esta disposição cria também uma competência para conhecer de uma ação resolutória no âmbito da insolvência contra um demandado com domicílio num Estado terceiro. Com efeito, uma harmonização, na União, das regras de competência jurisdicional para as ações resolutórias no âmbito da insolvência contribui para a realização desses objetivos, independentemente de saber se o demandado tem o domicílio num Estado‑Membro ou num Estado terceiro.
34 Esta conclusão não é posta em causa pelo facto, salientado pelo Governo alemão na audiência, de que o demandado no âmbito de uma tal ação resolutória seria chamado a litigar num tribunal de um Estado que não é o do seu domicílio.
35 Com efeito, impõe‑se concluir que o critério, estabelecido pelo regulamento, para determinar o órgão jurisdicional competente para conhecer desta ação, ou seja, o do centro dos interesses principais do devedor, é normalmente previsível para o demandado que o pode levar em conta quando participa, com o devedor, num ato que pode ser anulado no âmbito de um processo de insolvência. Nestas condições, os objetivos de previsibilidade da competência jurisdicional em matéria de insolvência e de segurança jurídica, que resultam do considerando 8 do regulamento, bem como, eventualmente, o objetivo de evitar que as partes sejam incentivadas a transferir os seus bens de um Estado para outro, ou a escolher um foro particular, no intuito de obter uma posição legal mais favorável, referido no considerando 4 do regulamento, prevalecem sobre a preocupação de evitar que o demandado seja chamado a juízo num tribunal estrangeiro.
36 Também não procede o argumento de que os órgãos jurisdicionais de um Estado terceiro não estão de modo algum obrigados a reconhecer ou a executar uma decisão proferida por um tribunal competente da União, ou, dito por outras palavras, que a aplicação do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento, no caso de o demandado ter o seu domicílio num Estado terceiro, não tem efeito útil.
37 Com efeito, como salientou a advogada‑geral nos n.os 36 e 38 das suas conclusões, a inoponibilidade a Estados terceiros das disposições do regulamento relativas ao reconhecimento e à execução de decisões proferidas pelo tribunal em cujo território se iniciou o processo de insolvência não impede a aplicação da regra de competência prevista no artigo 3.°, n.° 1, deste regulamento. Além disso, mesmo se, num caso concreto, não for possível invocar o próprio regulamento para efeitos de reconhecimento e de execução das decisões do órgão jurisdicional competente, pode ser possível obter o reconhecimento e a execução dessa decisão ao abrigo de uma convenção bilateral.
38 Por outro lado, cumpre constatar que, mesmo na falta de reconhecimento e da execução, invocando uma convenção bilateral, de uma tal decisão pelo Estado em que se situa o domicílio do demandado, esse acórdão pode ser reconhecido e executado pelos outros Estados‑Membros, por força do artigo 25.° do regulamento, designadamente no caso de uma parte do património desse demandado se encontrar no território de um desses Estados.
39 Em face do exposto, há que responder à questão submetida que o artigo 3.°, n.° 1, do regulamento deve ser interpretado no sentido de que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi instaurado o processo de insolvência têm competência para conhecer de uma ação resolutória no âmbito da insolvência contra um demandado cujo domicílio não se situa no território de um Estado‑Membro.
Quanto às despesas
40 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:
O artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1346/2000 do Conselho, de 29 de maio de 2000, relativo aos processos de insolvência, deve ser interpretado no sentido de que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi instaurado o processo de insolvência têm competência para conhecer de uma ação resolutória no âmbito da insolvência contra um demandado cujo domicílio não se situa no território de um Estado‑Membro.
Assinaturas
* Língua do processo: alemão.
apresentadas em 10 de setembro de 2013 (1)
Processo C‑328/12
Ralph Schmid (na qualidade de administrador da insolvência no processo de insolvência relativo ao património de Aletta Zimmermann)
contra
Lilly Hertel
[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof (Alemanha)]
«Cooperação judiciária em matéria civil – Processo de insolvência – Regulamento (CE) n.° 1346/2000 – Competência do órgão jurisdicional do Estado‑Membro onde está situado o centro dos interesses principais do devedor – Ação revogatória no âmbito da insolvência – Elemento extraterritorial – Demandado que reside num país terceiro»
1. O artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1346/2000 do Conselho (2) (a seguir «regulamento») determina quais são os órgãos jurisdicionais que têm competência internacional para abrir processos de insolvência. No âmbito desses processos, os síndicos podem propor «qualquer ação revogatória útil aos interesses dos credores» (3). No caso em apreço, a questão que se coloca é a de saber se a regra de competência prevista no artigo 3.°, n.° 1, se aplica quando o demandado numa ação revogatória tem domicílio num país terceiro.
Regulamento relativo aos processos de insolvência
2. O regulamento prevê, no essencial, a atribuição de competência, a determinação do direito aplicável e o mútuo reconhecimento dos processos de insolvência. O presente processo depende da interpretação da regra geral sobre competência internacional. Contudo, no âmbito da análise, é necessário considerar o regime geral do regulamento e o papel do administrador da insolvência.
3. Os segundo, terceiro e quarto considerandos do regulamento explicam que o bom funcionamento do mercado interno exige que os processos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços se efetuem de forma eficiente e eficaz, e que para assegurar o bom funcionamento do mercado interno, há que evitar quaisquer incentivos que levem as partes a transferir bens ou ações judiciais de um Estado‑Membro para outro, no intuito de obter uma posição legal mais favorável (forum shopping).
4. O oitavo considerando refere que para alcançar esses objetivos é «necessário […] que as disposições em matéria de competência, reconhecimento e direito aplicável neste domínio constem de um ato normativo da Comunidade».
5. Os considerandos 12 a 14 referem o seguinte:
«(12) O presente regulamento permite que o processo de insolvência principal seja aberto no Estado‑Membro em que se situa o centro dos interesses principais do devedor. O processo tem alcance universal, visando abarcar todo o património do devedor. Para proteger a diversidade dos interesses, o presente regulamento permite que os processos secundários eventualmente instaurados corram paralelamente ao processo principal. Pode‑se instaurar um processo secundário no Estado‑Membro em que o devedor tenha um estabelecimento. Os efeitos dos processos secundários limitar‑se-ão aos ativos situados no território desse Estado. A necessidade de manter a unidade dentro da Comunidade é garantida por normas imperativas de coordenação com o processo principal.
(13) O ‘centro dos interesses principais’ do devedor deve corresponder ao local onde o devedor exerce habitualmente a administração dos seus interesses, pelo que é determinável por terceiros.
(14) O presente regulamento aplica‑se exclusivamente aos processos em que o centro dos interesses principais do devedor está situado na Comunidade.»
6. O capítulo I do regulamento está sob a epígrafe «Disposições gerais». Neste capítulo, o artigo 1.° («Âmbito de aplicação»), prevê no n.° 1:
«O presente regulamento é aplicável aos processos coletivos em matéria de insolvência do devedor que determinem a inibição parcial ou total desse devedor da administração ou disposição de bens e a designação de um síndico.»
7. Nos termos do artigo 2.°, alínea a), entende‑se por «processo de insolvência» «os processos coletivos» enumerados no anexo A do regulamento, uma lista que abrange tipos específicos de processos em cada Estado‑Membro conforme definidos no direito nacional.
8. Nos termos do artigo 2.°, alínea b), entende‑se por «síndico» «qualquer pessoa ou órgão cuja função seja administrar ou liquidar os bens de cuja administração ou disposição o devedor esteja inibido ou fiscalizar a gestão dos negócios do devedor».
9. O artigo 3.° do regulamento sob a epígrafe «Competência internacional», prevê o seguinte:
«1. Os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território está situado o centro dos interesses principais do devedor são competentes para abrir o processo de insolvência. Presume‑se, até prova em contrário, que o centro dos interesses principais das sociedades e pessoas coletivas é o local da respetiva sede estatutária.
2. No caso de o centro dos interesses principais do devedor se situar no território de um Estado‑Membro, os órgãos jurisdicionais de outro Estado‑Membro são competentes para abrir um processo de insolvência relativo ao referido devedor se este possuir um estabelecimento no território desse outro Estado‑Membro. Os efeitos desse processo são limitados aos bens do devedor que se encontrem neste último território.
3. Quando um processo de insolvência for aberto ao abrigo do disposto no n.° 1, qualquer processo de insolvência aberto posteriormente ao abrigo do disposto no n.° 2 constitui um processo secundário. Este processo deve ser um processo de liquidação.»
10. No capítulo II, sob a epígrafe «Reconhecimento do processo de insolvência», o artigo 16.° («Princípio») prevê o seguinte no n.° 1:
«Qualquer decisão que determine a abertura de um processo de insolvência, proferida por um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro competente por força do artigo 3.°, é reconhecida em todos os outros Estados‑Membros logo que produza efeitos no Estado de abertura do processo. […]»
11. O artigo 17.° («Efeitos do reconhecimento») prevê no n.° 1:
«A decisão de abertura de um processo referido no n.° 1 do artigo 3.° produz, sem mais formalidades, em qualquer dos demais Estados‑Membros, os efeitos que lhe são atribuídos pela lei do Estado de abertura do processo, salvo disposição em contrário do presente regulamento e enquanto não tiver sido aberto nesse outro Estado‑Membro um processo referido no n.° 2 do artigo 3.°»
12. O artigo 18.° («Poderes do síndico») estabelece, designadamente, que:
«1. O síndico designado por um órgão jurisdicional competente por força do n.° 1 do artigo 3.° pode exercer no território de outro Estado‑Membro todos os poderes que lhe são conferidos pela lei do Estado de abertura do processo, […]
2. O síndico […] pode igualmente propor qualquer ação revogatória útil aos interesses dos credores.
3. No exercício dos seus poderes, o síndico deve observar a lei do Estado‑Membro em cujo território pretende agir, em especial as disposições que digam respeito às formas de liquidação dos bens. Esses poderes não podem incluir o uso de meios coercivos, nem o direito de dirimir litígios ou diferendos.»
13. O artigo 25.° do regulamento («Reconhecimento e caráter executório de outras decisões») prevê no n.° 1:
«As decisões relativas à tramitação e ao encerramento de um processo de insolvência proferidas por um órgão jurisdicional cuja decisão de abertura do processo seja reconhecida por força do artigo 16.°, bem como qualquer acordo homologado por esse órgão jurisdicional, são igualmente reconhecidos sem mais formalidades. […]
O primeiro parágrafo é igualmente aplicável às decisões diretamente decorrentes do processo de insolvência e que com este se encontrem estreitamente relacionadas, mesmo que proferidas por outro órgão jurisdicional.
[…]»
14. O artigo 44.°, n.° 1, refere que o regulamento substitui, nas relações entre os Estados‑Membros, no seu âmbito de aplicação concreto, as convenções bilaterais concluídas entre dois ou mais Estados‑Membros. O artigo 44.°, n.° 3, alínea a) determina, no entanto, que o regulamento não é aplicável «quando incompatível com as obrigações em matéria de falência resultantes de uma convenção concluída por esse Estado com um ou mais países terceiros antes da entrada em vigor [deste] regulamento».
Matéria de facto, tramitação processual e questão prejudicial
15. Ralph Schmid é administrador da insolvência no processo de insolvência aberto contra Aletta Zimmermann em 4 de maio de 2007. No âmbito desse processo, interpôs uma ação contra Lilly Hertel para anulação de um negócio celebrado entre esta e A. Zimmermann. Lilly Hertel, sogra de A. Zimmermann, reside na Suíça. Parece que o processo não apresenta outros elementos internacionais (como o envolvimento de outro Estado‑Membro da União além da Alemanha). Com a ação, o administrador da insolvência pretende recuperar, enquanto parte do património de A. Zimmermann, a quantia de 8015,08 euros acrescida de juros.
16. A ação foi declarada inadmissível pelas instâncias anteriores com fundamento na falta de competência internacional dos órgãos jurisdicionais alemães. R. Schmid interpôs no Bundesgerichtshof (a seguir «órgão jurisdicional de reenvio») recurso de revista (Revision) dessa decisão.
17. Concluindo que o resultado do litígio depende da interpretação do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento, a 9.ª secção civil do Bundesgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:
«Os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi instaurado o processo de insolvência relativo ao património do devedor dispõem de competência para conhecer de uma ação revogatória no âmbito da insolvência contra um demandado cujo domicílio ou sede estatutária não se situa no território de um Estado‑Membro?»
18. Apresentaram observações escritas R. Schmid e a Comissão. Na audiência, ocorrida em 10 de abril de 2013, o Governo alemão e a Comissão apresentaram alegações orais.
Alegações das partes
19. R. Schmid alega que o artigo 3.°, n.° 1, do regulamento deve ser interpretado no sentido de que atribui competência para conhecer da ação aos órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro onde foi instaurado o processo. O único critério de competência previsto no artigo 3.°, n.° 1, é o da localização do centro dos interesses principais do devedor. Acrescentar uma condição suplementar, como a de que deve haver o envolvimento de um ou mais Estados‑Membros, introduziria incerteza jurídica no início do processo. A interpretação sugerida do artigo 3.°, n.° 1, satisfaz o princípio da unidade processual. Também reforça o bom funcionamento do mercado único ao evitar a eventual transferência de ativos para fora da União Europeia para obter benefícios (forum shopping) e ao facilitar a possibilidade de o administrador da insolvência impugnar e anular a transferência dos bens do devedor para fora da União Europeia.
20. A Comissão concorda. O artigo 3.°, n.° 1, atribui competência internacional aos órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro onde está situado o centro dos interesses principais do devedor. Não existe nenhuma condição adicional relativa à competência para conhecer de ações estreitamente relacionadas com o processo de insolvência: não é necessário que haja o envolvimento de outro Estado‑Membro. Pode e deve ser feita uma distinção entre as regras que regulam a competência internacional e as relativas ao reconhecimento e à execução de decisões. O direito da União não pode obrigar países terceiros a reconhecer e a executar decisões proferidas por tribunais da União Europeia em processos de insolvência.
21. O Governo alemão alega que o direito da União só pode produzir efeitos em relação a países terceiros através de convenções bilaterais ou multilaterais. A União Europeia não celebrou qualquer convenção desse tipo sobre processos de insolvência com a Suíça, onde L. Hertel tem domicílio. Além disso, os objetivos do regulamento não permitem a extensão da regra sobre competência internacional a um processo secundário para revogação de uma transação anterior que envolve um demandado com domicílio situado num país terceiro. O regulamento tem por objetivo assegurar que o processo de insolvência funcione de forma eficiente e eficaz no mercado interno, onde não participam países terceiros. Não regula a competência de uma forma isolada; pelo contrário, as regras de competência fazem parte de uma estrutura geral com vista à eficiência e à eficácia do processo de insolvência. Uma vez que as regras relativas ao reconhecimento e à execução não podem ser aplicadas a países terceiros, a interpretação do artigo 3.°, n.° 1, no sentido de atribuir a um órgão jurisdicional competência internacional em relação a países terceiros seria ineficaz. Também exporia os demandados, que já são a parte em situação de inferioridade, a um direito em matéria processual e de insolvência com o qual não estão familiarizados, agravando ainda mais a sua situação.
Apreciação
22. O regulamento tem por objetivo melhorar a eficiência e a eficácia dos processos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços (4). Para esse efeito, o regulamento estabelece regras em matéria de competência comuns a todos os Estados‑Membros; regras para facilitar o reconhecimento de decisões; e regras respeitantes ao direito aplicável (5). Essas regras baseiam‑se nos princípios da unidade e da universalidade (6), modificados para permitir processos secundários limitados. Deste modo, o regulamento prevê que um único processo principal, num único Estado‑Membro, deve abranger a totalidade do património do devedor, independentemente do local onde se encontre esse património, sem prejuízo da possibilidade limitada de abertura de processos secundários num segundo Estado‑Membro (7).
23. A regra de competência prevista no artigo 3.°, n.° 1, já foi chamada a «pedra angular» do sistema criado pelo regulamento (8). Prevê que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro onde está situado o centro dos interesses principais do devedor são competentes para abrir o processo de insolvência. Assim, nos termos do regulamento, o centro dos interesses principais do devedor desempenha o papel central na determinação da competência (9).
24. O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território foi instaurado o processo de insolvência relativo ao património do devedor dispõem de competência para revogar uma transação contra um demandado que é residente num país terceiro. Contudo, antes de responder a essa questão, é necessário determinar se, numa situação em que o único elemento internacional da insolvência se verifica entre um Estado‑Membro e um país terceiro (e não entre dois ou mais Estados‑Membros), os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro onde o centro dos interesses principais do devedor está situado dispõem de competência para conhecer do processo de insolvência por força do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento, ou como consequência do direito nacional em matéria de insolvência desse Estado‑Membro e do direito internacional privado. (Neste último caso, a eventual competência internacional desses órgãos seria determinada pelas convenções bilaterais existentes entre esse Estado‑Membro e os países terceiros.) Por outras palavras: o regulamento aplica‑se a esse processo?
25. Entendo que sim. O artigo 1.°, n.° 1, refere que o regulamento é aplicável aos «processos coletivos em matéria de insolvência do devedor que determinem a inibição parcial ou total desse devedor da administração ou disposição de bens e a designação de um síndico». Nem o artigo 1.°, n.° 1, nem o anexo A parecem limitar a aplicação do regulamento aos processos que contêm um elemento transfronteiriço.
26. O regulamento é uma medida diretamente aplicável. No momento da sua entrada em vigor, substituiu todas as leis nacionais e convenções bilaterais (10) em que os Estados‑Membros eram partes que determinavam a competência internacional no que diz respeito ao processo de insolvência, sem prejuízo apenas do artigo 44.º, n.° 3 (11). No caso de o centro dos interesses principais do devedor se situar no território da União Europeia, o artigo 3.°, n.° 1, (e não o direito nacional) é portanto aplicável para determinar qual é o Estado‑Membro cujos órgãos jurisdicionais dispõem de competência para abrir um processo.
27. Como alega o Governo alemão, a base para a ação legislativa da União, ao promulgar o regulamento, é a necessidade de garantir o bom funcionamento do mercado interno (v. segundo, terceiro, quarto e oitavo considerandos) Porém, daí não resulta que seja necessário mostrar que existe um elemento transfronteiriço num determinado processo de insolvência para o regulamento se aplicar. A interpretação do regulamento no sentido de que só se aplica em circunstâncias em que existe um elemento de envolvimento transfronteiriço de, pelo menos, dois Estados‑Membros da União, levaria a uma grande incerteza e frustraria a eficácia e a eficiência do processo.
28. Para que o regulamento seja aplicável, o próprio processo de insolvência deve, como é evidente, envolver um devedor cujo centro dos seus interesses principais está situado num Estado‑Membro (v. considerando 14). Se isso não acontecer, o regulamento não poderá aplicar‑se. O regulamento «permite que o processo de insolvência seja aberto no Estado‑Membro em que se situa o centro dos interesses principais do devedor» e especifica que «o processo tem alcance universal, visando abarcar todo o património do devedor» (12). Tal como a entendo, esta declaração reflete os princípios da unidade e da universalidade. Considero que estes são princípios desejáveis e que devem ser aplicados em qualquer processo de insolvência.
29. Ora, a determinação do órgão jurisdicional competente deve ser feita o mais cedo possível, para que possam ser tomadas medidas de preservação do património do devedor para os seus credores, garantindo‑se, deste modo, a eficácia e eficiência do processo (13). Com efeito, o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão Staubitz‑Schreiber (14) que, para determinar o tribunal competente para abrir um processo de insolvência, o centro dos interesses principais do devedor deve ser determinado no momento da apresentação do requerimento de abertura do processo de insolvência, e não na data em que o processo é efetivamente aberto. Nessa fase inicial, a existência de qualquer elemento transfronteiriço pode ser desconhecida. Contudo, a determinação do órgão jurisdicional competente não pode ser adiada até ao momento em que seja conhecida a localização de diversos aspetos do processo (como a residência de potenciais demandados em ações secundárias ou a localização de cada um dos bens do devedor), além do centro dos interesses do devedor. Aguardar até obter o conhecimento completo frustraria os objetivos da eficiência e da eficácia do processo de insolvência que são prosseguidos pelo regulamento e conduziria à incerteza jurídica.
30. O próprio artigo 3.°, n.° 1, do regulamento refere inequivocamente que «[o]s órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro em cujo território está situado o centro dos interesses principais do devedor são competentes para abrir o processo de insolvência.» (15) Qualquer outro elemento é irrelevante para a determinação do órgão jurisdicional competente. Assim, a localização dos bens do devedor é irrelevante, exceto na medida em que possa ser um elemento a ter em conta na determinação da localização do centro dos interesses principais do devedor e/ou da eventual necessidade de abertura de um processo secundário nos termos do artigo 3.°, n.° 2. O local de residência de um potencial demandado numa ação que pode (se necessário) ser posteriormente instaurada nesse processo pelo administrador da insolvência para revogar uma transação e recuperar ativos adicionais em benefício dos credores é, de igual modo, irrelevante para a questão de saber qual o órgão jurisdicional competente para abrir um processo. Tal ação é da competência do órgão jurisdicional que (já) iniciou o processo de insolvência porque é uma ação decorrente diretamente desse processo e com ele estreitamente relacionada (16). Nessa fase, o processo de insolvência já está em curso. A ação revogatória é cronologicamente posterior à abertura do processo de insolvência no órgão jurisdicional competente. Daí resulta que a localização do demandado nessa ação não pode afetar a determinação, em primeiro lugar, do órgão jurisdicional competente para abrir o processo de insolvência.
31. Por conseguinte, entendo que não é necessário demonstrar um elemento transfronteiriço do envolvimento de dois ou mais Estados‑Membros para que o regulamento seja aplicável. Desde que o centro dos interesses principais do devedor esteja situado na União Europeia (17), o artigo 3.°, n.° 1, do regulamento, que é diretamente aplicável em todos os Estados‑Membros, determina qual é o órgão jurisdicional competente.
32. O órgão jurisdicional competente também dispõe de competência para conhecer de uma ação revogatória instaurada pelo administrador da insolvência, em que o demandado nessa ação não está domiciliado noutro Estado‑Membro, mas num país terceiro?
33. O Governo alemão alega que o regulamento não atribui competência em relação a uma ação deste tipo. O potencial demandado e, muito possivelmente, os bens em questão estão localizados fora da União Europeia. O facto de o demandado ter de contestar a ação numa jurisdição que é para si uma jurisdição estrangeira colocá-lo-ia numa situação de inferioridade. Além disso, o regulamento prevê expressamente o reconhecimento e a execução de decisões do órgão jurisdicional competente relativamente a transações que envolvam outro Estado‑Membro da União (18), mas os órgãos jurisdicionais de um país terceiro não estão obrigados a reconhecer ou a executar qualquer decisão eventualmente proferida por um órgão jurisdicional competente da União Europeia.
34. Estes argumentos não me convencem. Na minha opinião, o órgão jurisdicional competente nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento pode decidir uma ação instaurada pelo administrador da insolvência para revogação de uma transação que envolva um demandado domiciliado num país terceiro.
35. Em primeiro lugar, os princípios da unidade e da universalidade são claramente favoráveis a uma tal abordagem. O processo de insolvência é um processo coletivo, e o órgão jurisdicional onde está situado o centro dos interesses principais do devedor trata (por definição) da grande maioria dos processos do devedor (caso contrário, a expressão «centro dos interesses principais» esvaziar‑se‑ia de sentido) (19). Se esse órgão jurisdicional – cuja competência para tratar da insolvência deve ser relativamente fácil de prever (20) – deve supervisionar uma análise correta do património do devedor e um acordo adequado com os seus credores, deve estar habilitado a decidir uma ação instaurada pelo administrador da insolvência para revogação de uma transação anterior entre o devedor e um terceiro, com o fim de devolver o objeto ou os lucros dessa transação ao património do devedor em benefício dos credores.
36. Em segundo lugar, não penso que o facto de as disposições do regulamento relativas ao reconhecimento e à execução de decisões não vincularem países terceiros impeça a aplicação da regra de competência. É importante e útil fazer uma distinção entre competência, por um lado, e reconhecimento e execução, por outro.
37. Quanto à competência, esta é determinada pelo regulamento apenas por referência ao local onde está situado o centro dos interesses principais do devedor. O Tribunal de Justiça já decidiu relativamente a uma insolvência exclusivamente intra‑União que esse órgão jurisdicional deve ter competência não só em relação ao processo de insolvência principal, mas também em relação a qualquer processo secundário (21).
38. Quanto ao reconhecimento e à execução de decisões, observo, em primeiro lugar, que estas disposições podem ser lidas independentemente da disposição sobre a atribuição da competência. Em segundo lugar, mesmo que não seja possível invocar o próprio regulamento para efeitos de reconhecimento e de execução, uma decisão do órgão jurisdicional competente não é necessariamente destituída de todo e qualquer efeito. Pode ser possível (embora, aparentemente, não no caso em apreço) obter o reconhecimento e a execução dessa decisão ao abrigo de uma convenção bilateral.
39. É verdade que se o administrador da insolvência obtiver uma decisão de anulação de uma determinada transação anterior que envolva um terceiro, terá de solicitar o reconhecimento e a execução dessa decisão no Estado onde esse terceiro está domiciliado (e/ou onde os bens objeto da transação estão situados). Nesta perspetiva, esse processo será, apesar de tudo, mais eficaz e menos dispendioso do que iniciar um processo completamente separado nessa jurisdição (e um processo menos dispendioso preserva mais o património do devedor em benefício dos credores). Na melhor das hipóteses, a decisão que o administrador da insolvência já obteve será reconhecida e executada; na pior das hipóteses, o administrador da insolvência terá de regressar ao órgão jurisdicional competente no Estado‑Membro da União e pedir uma redução do valor da avaliação dos bens do devedor antes de avançar para o acordo final com os credores.
40. Na perspetiva do terceiro, a ausência do reconhecimento e da execução automáticos confere‑lhe uma certa proteção adicional. Pode ser que esse terceiro, quando notificado da ação instaurada pelo administrador da insolvência, opte por comparecer e contestar o processo perante o órgão jurisdicional do centro dos interesses principais do devedor. Se, por qualquer motivo, não o pôde ou não o quis fazer, terá motivos mais fortes para pedir ao órgão jurisdicional local que não reconheça nem execute automaticamente a decisão proferida contra si, mas que examine a ação quanto ao mérito.
41. Em terceiro lugar, há que salientar que, no acórdão Owusu (22), que tinha por objeto a interpretação da regra de competência prevista no artigo 2.° da Convenção de Bruxelas (23) (nos termos da qual «as pessoas domiciliadas no território de um Estado contratante devem ser demandadas […] perante os tribunais desse Estado»), a Grande Secção decidiu que essa disposição também se aplicava numa situação que abrange as relações entre os órgãos jurisdicionais de um único Estado contratante e as de um Estado não contratante (24). No referido processo, um dos demandados estava domiciliado no Reino Unido, mas outros demandados estavam domiciliados na Jamaica, onde tinha ocorrido o acidente na origem do litígio, e discutia‑se (de forma plausível) que o forum conveniens do processo era a Jamaica. Nesse caso (como no presente) a questão envolvia um Estado contratante e um país terceiro: não estava em causa o foro de nenhum outro Estado contratante; e a causa não apresentava elementos de conexão com nenhum outro Estado contratante (25). Não obstante, a Grande Secção decidiu que a regra de competência prevista no artigo 2.° da Convenção de Bruxelas tinha natureza imperativa e rejeitou qualquer possibilidade de um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro aplicar a doutrina do forum non conveniens e de se declarar incompetente.
42. Os argumentos apresentados pelo Governo alemão no caso em apreço são muito semelhantes aos alegados sem sucesso pelo Reino Unido no acórdão Owusu (26).
43. Assim, é evidente que ao proferir uma decisão sobre o processo Owusu, a Grande Secção estava ciente de que, se decidisse que os órgãos jurisdicionais do Estado contratante em questão (Reino Unido) não podiam declarar‑se incompetentes em favor dos órgãos jurisdicionais de um Estado não contratante (Jamaica), podiam eventualmente surgir dificuldades relativas ao reconhecimento e à execução da decisão proferida (27). De igual modo, no acórdão Owusu, o Tribunal de Justiça considerou especificamente o princípio do efeito relativo dos tratados (nesse contexto, o princípio de que a Convenção de Bruxelas não podia impor qualquer obrigação aos Estados que não aceitaram ficar por ela vinculados). O Tribunal de Justiça declarou que, «[a] este respeito, basta observar que a designação de um órgão jurisdicional de um Estado contratante como competente, em virtude de o demandado ter domicílio no território desse Estado, mesmo a propósito de um litígio que se relaciona, pelo menos em parte, devido ao seu objeto ou ao domicílio do demandante, com um Estado terceiro não é suscetível de obrigar este último Estado» (28). Deu prevalência aos princípios da segurança jurídica (29), da proteção jurídica das pessoas estabelecidas na Comunidade (30) e da aplicação uniforme das regras de competência, recordando que «o objetivo da Convenção de Bruxelas é precisamente prever regras comuns, com exclusão das regras nacionais exorbitantes» (31).
44. A Grande Secção reconheceu expressamente a possibilidade de existirem dificuldades reais (tais como «dificuldades logísticas ligadas à distância geográfica, à necessidade de apreciar o mérito do litígio segundo os critérios jamaicanos, à possibilidade de obter na Jamaica a execução de uma decisão proferida à revelia e à impossibilidade de fazer um pedido reconvencional contra os outros demandados»); mas decidiu que «independentemente da realidade dessas dificuldades […] tais considerações […] não são […] suscetíveis de pôr em causa o caráter obrigatório da regra fundamental de competência, contida no artigo 2.° da Convenção de Bruxelas» (32).
45. Parece‑me que as mesmas considerações que levaram a Grande Secção à sua conclusão no processo Owusu se aplicam ao presente processo; e que, portanto, o acórdão Owusu se deve aplicar por analogia ao caso em apreço.
46. Em quarto lugar, a decisão de que o órgão jurisdicional competente nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento também dispõe de competência, no âmbito do processo de insolvência, para decidir sobre um pedido de revogação de uma transação anterior celebrada entre o devedor e um demandado domiciliado num país terceiro está em conformidade com o objetivo do regulamento de promover o bom funcionamento do mercado interno. O regulamento reconhece expressamente (no quarto considerando) a necessidade de «evitar quaisquer incentivos que levem as partes a transferir bens ou ações judiciais de um Estado‑Membro para outro, no intuito de obter uma posição legal mais favorável (forum shopping)». Mas considerações semelhantes também se aplicam numa situação entre a União Europeia e um país terceiro. Se o órgão jurisdicional competente nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento não tem competência para decidir sobre um pedido de revogação de uma tal transação anterior, existe um incentivo óbvio para a pessoa (ou empresa) que percebe que começa a ter dificuldades financeiras transferir os bens para fora da União Europeia através de transações duvidosas ou fictícias com terceiros domiciliados em países terceiros, afastando assim esses bens do alcance do administrador da insolvência e privando os credores da possibilidade de recuperarem, tanto quanto possível, os seus créditos a partir do património do devedor.
47. Por conseguinte, concluo que a abordagem defendida por R. Schmid (administrador da insolvência) e pela Comissão deve ser preferida à defendida pelo Governo alemão. A conclusão de que o órgão jurisdicional competente nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do regulamento tem competência para apreciar uma ação instaurada pelo administrador da insolvência para revogação de uma transação anterior celebrada entre o devedor e um demandado domiciliado num país terceiro respeita os princípios da unidade e da universalidade e favorece os objetivos do mercado único. O administrador da insolvência poderá lidar com o património do devedor de um modo mais eficaz e com custos mais reduzidos, o que reverterá em benefício dos credores (muitos dos quais estão provavelmente domiciliados na União Europeia). Estas vantagens superam as eventuais desvantagens sofridas pelo demandado de um país terceiro que tenha de contestar uma ação numa jurisdição que é para ele a «errada»; além disso – precisamente porque, nesse caso, uma eventual decisão não obterá automaticamente o reconhecimento e a execução previstos ao abrigo do regulamento – o demandado de um país terceiro poderá, em todo o caso, continuar a beneficiar de uma certa proteção dos respetivos órgãos de jurisdição locais.
Conclusão
48. Pelos motivos acima expostos, proponho que o Tribunal de Justiça responda à questão submetida pelo Bundesgerichtshof (Alemanha) do seguinte modo:
O artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1346/2000 do Conselho, de 29 de maio de 2000, relativo aos processos de insolvência deve ser interpretado no sentido de que os órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro onde foi instaurado o processo de insolvência dispõem de competência para conhecer de uma ação revogatória no âmbito da insolvência contra um demandado cujo domicílio ou sede estatutária não se situa no território de um Estado‑Membro.
1 – Língua original: inglês.
2 – Regulamento n.° 1346/2000 do Conselho, de 29 de maio de 2000, relativo aos processos de insolvência (JO L 160, p. 1) conforme alterado.
3 – Artigo 18.°, n.° 2, último período, do regulamento.
4 – V. segundo e oitavo considerandos do regulamento, já referidos nos n.os 3 e 4, supra.
5 – V. oitavo considerando, já referido no n.° 4, supra.
6 – V. considerando 12, já referido no n.° 5, supra, e acórdão de 17 de janeiro de 2006, Staubitz‑Schreiber (C‑1/04, Colet., p. I‑701, n.° 28). O «princípio da unidade» implica a existência de um único processo de insolvência. O «princípio da universalidade» implica a extensão desse processo a todos os ativos do devedor, independentemente do local onde se encontrem.
7 – Os processos secundários só podem ser processos de liquidação e produzir efeitos em relação aos ativos situados nesse Estado: v. considerando 12 já referido no n.° 5, supra. O sistema previsto pelo regulamento já foi adequadamente referido por um autor como um sistema de «universalidade coordenada»: v. Wessels, Bob (Prof.) – «The Changing Landscape of Cross‑border Insolvency Law in Europe», Juridica International XII/2007, p. 116 a 124.
8 – V. n.° 21 das conclusões apresentadas pelo advogado‑geral Ruiz‑Jarabo Colomer em 6 de setembro de 2005, no processo Staubitz‑Schreiber, já referido na nota 6, supra.
9 – Tal como no Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO L 12, p. 1, a seguir «Regulamento de Bruxelas»), o domicílio do demandado desempenha o papel central na determinação da competência internacional, sem prejuízo de algumas exceções limitadas.
10 – Artigo 44.°, n.° 1.
11 – Citado no n.° 14, supra. Parece que não existe nenhuma convenção bilateral pertinente entre a Alemanha e a Suíça que torne essa disposição aplicável ao presente processo.
12 – Considerando 12.
13 – A necessidade de aplicação imediata da regra de competência do regulamento para assegurar a eficácia do processo também foi salientada em relação ao sistema de reconhecimento mútuo no acórdão de 2 de maio de 2006, Eurofood IFSC (C‑341/04, Colet., p. I‑3813, n.° 52).
14 – Já referido na nota 6, supra.
15 – Quanto à abordagem a seguir na determinação da localização do centro dos interesses principais do devedor, v.: acórdão Staubitz‑Schreiber, já referido na nota 6, supra, acórdão Eurofood IFSC, já referido na nota 13, supra, e acórdão de 20 de outubro de 2011, Interedil (C‑396/09, ainda não publicado na Coletânea).
16 – V. acórdão de 12 de fevereiro de 2009, Seagon (C‑339/07, Colet., p. I‑767, n.os 21 e 28); v. também sexto considerando do regulamento.
17 – V. considerando 14, já referido no n.° 5, supra.
18 – V. artigos 16.° (Princípio do reconhecimento), 17.° (Efeitos do reconhecimento) e 25.° (Reconhecimento e caráter executório de outras decisões). Em especial, o artigo 25.°, n.° 1, prevê que as decisões relativas «à tramitação e ao encerramento de um processo de insolvência […], bem como qualquer acordo homologado por esse órgão jurisdicional» devem ser reconhecidos «sem mais formalidades»; e o seu n.° 2 determina expressamente que «o primeiro parágrafo é igualmente aplicável às decisões diretamente decorrentes do processo de insolvência e que com este se encontrem estreitamente relacionadas, mesmo que proferidas por outro órgão jurisdicional.»
19 – De acordo com o considerando 13 (já referido no n.° 5, supra), o centro dos interesses principais do devedor corresponde ao local onde o devedor exerce habitualmente a administração dos seus interesses, pelo que é determinável por terceiros.
20 – Um dos objetivos da regra da competência consiste em garantir a segurança jurídica e a previsibilidade respeitante à identificação do órgão jurisdicional competente para abrir o processo principal de insolvência: v. acórdãos Staubitz‑Schreiber, já referido na nota 6, n.° 27, e Eurofood IFSC, já referido na nota 13, n.° 33.
21 – V. acórdão Seagon, já referido na nota16, supra.
22 – Acórdão de 1 de março de 2005, Owusu (C‑281/02, Colet., p. I‑1383).
23 – A convenção de 27 de setembro de 1968 relativa à competência jurisdicional e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1978, L 304, p. 36), conforme alterada (a seguir «Convenção de Bruxelas»). A Convenção de Bruxelas foi substituída pelo Regulamento de Bruxelas, já referido na nota 9,supra.
24 – Acórdão Owusu, já referido na nota 22, supra, n.° 35.
25 – O que foi, de facto, salientado na formulação da primeira questão prejudicial: v. n.° 22 do acórdão.
26 – V. n.os 30 e 32 do acórdão.
27 – V. n.° 21 do acórdão, do qual resulta que esta dificuldade foi salientada pelo órgão jurisdicional de reenvio.
28 – N.° 31.
29 – V. n.os 38 a 41.
30 – V. n.° 42.
31 – V. n.° 43.
32 – N.os 44 e 45. V. também, em relação aos alegados obstáculos à aplicação do artigo 2.° da Convenção de Bruxelas a uma relação jurídica ligada apenas a um Estado contratante e a um Estado terceiro, as conclusões extremamente pormenorizadas e exaustivas do advogado‑geral Léger, apresentadas nesse processo em 14 de dezembro de 2004, n.os 177 a 216.